terça-feira, 20 de fevereiro de 2018
de filha pra mãe
desde criança, quando nem tinha horário marcado pra acordar, mamãe dizia que trabalho era pra sobreviver, e que não cabia sonhos nessa função. eu acho que mamãe nunca sonhou, nem com trabalho, nem com outras coisitas más. eu tenho dúvidas se a vida lhe foi dura, ou se ela endureceu ao longo da vida. no que me cabe, tento amolecer seu corpo com abraços mais longos que os minutos por ela programados. fico naquele abraço até sentir as mãos me soltarem, quando então eu digo: mamãe, fica mais um pouco por aqui. e ela fica, cheia de amor, feliz porque eu peço pra morar por ali. mamãe sempre teve despertador, até nos domingos de manhã. depois de muitos anos, ela decidiu trabalhar menos, eu achei que então ela teria mais tempo. mas não. mamãe ocupou cada intervalo entre os ponteiros com compromissos sempre atrasados antes de sua chegada. a corrida não estava portanto na falta das horas, descobri que mamãe corre é nas veias.
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