quinta-feira, 27 de outubro de 2011

a real boniteza

a beleza dele não estava na tela da tv, tampouco nas capas de revista, também não poderia ser capturada pelos flashes, a beleza dele não era resultado das tantas academias, definitivamente não era uma beleza comprada, a beleza dele exalava o cheiro da pele, seu corpo não se fazia cabide das vitrines, e sua fala era preenchida por um estilo de vida condizente aos desejos, não reconheci a sua boniteza de imediato, as vezes acabo reproduzindo a cultura que me envolve, mas não demorou muito para eu descobrir naquele menino um tanto quanto fora dos padrões estéticos o meu melhor modelo de beleza, oh menino bonito esse, viu?

visão dos poros

certa vez conheci uma menina que quando queria enxergar passeava a pele pela textura dos objetos, conhecendo suas superfícies, ela guardava as cores, formas, conteúdos nos poros, eram eles que construíam pontes para além da visão, a menina se preocupava pouco com as imagens passíveis de molduras guardando fotografias, a menina adentrava nas curvas, na música de cada um, nos movimentos despercebidos, na velocidade da respiração, a menina capturava sentidos, a menina, literalmente, não enxergava as aparências, diziam que ela era cega, mas com certeza não sabiam que existem várias formas de visão.

terça-feira, 25 de outubro de 2011

pra ler você

nas noites que você não está
descrevo-o minimamente em pedaços de papel
só pra depois eu poder ler você repetidas vezes
e supor que estás nas entrelinhas dos meus pensamentos...

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

medida exata

as esquinas dos seus olhos são tão afiadas que trincam imediatamente o meu suposto chão, deixa-me vulnerável o seu olhar fixo funcionando como arma feita pra matar, desvio-me deste desconforto, crio obstáculos que impeçam o encontro das minhas retinas nas suas ruas, mas você me percebe, me pega pelos braços tal qual corpo-objeto que não mais controla suas reações, descontrolo-me, obedeço inteiramente aos meus instintos, rasgo os pedaços de pano que separam nossas peles, atravesso meus planos, e me reconstruo aliviada, agora confortável por caber exatamente nos contornos seus, mais confortável ainda por me descobrir tal qual costura medida milimetricamente para outrem: você.

domingo, 9 de outubro de 2011

presença

capturava você nas esquinas dos seus impulsos, fotografava-os na esperança de desfazer a efemeridade, guardava tudo em cofres bem seguros da memória seletiva de coisas bonitas, só coisas bonitas, e toda vez que eu queria dormir ao lado seu bastava reservar para os minutos antes do sono o filme gravado pelas retinas de outrora, você já não era apenas corpo, era alma!

promessas com data de validade

qualquer que seja a promessa será sempre verdadeira, mas, talvez, amanhã já não o seja, verdades são temporais, dependem da temperatura ambiente, do que o corpo traduz em forma de sentido aos olhos, depende do que chega a pele e cria tempestades em dias de brisa programada, esta tende a ser a minha maior fragilidade, e de tanto escapar-me dos meus próprios trilhos descubro-me diante de um calendário sem datas, todos os dias parecem convergir para o segundo que acaba de passar, eu acabo me perdendo nesta rotação permanente do solo que hipoteticamente me serve de cais, invento nos braços dele a minha proteção, visto-me desta armadura feita de amor sem promessa, amor em tempo real, concluo que protejo-me dele, antecipo as curvas, me preparo diariamente para a promessa já empoeirada dos desejos de ontem.

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

liberdade

peixe não nada em aquário, passáro não voa em gaiola, cachorro não corre em canil, homem não ama em apartamento.

encontro fabricado

cobriu o corpo com um cachecol, ajustou a mochila nas asas e seguiu na direção das ruas, acendeu as velas quando o escurecer das coisas tornou seus pés receosos do próximo passo, enxergou sombras num filme preto e branco debaixo da madrugada, a luz que ela segurava nas mãos era suficiente para iluminar o necessário aos olhos, focava no que lhe era atingível com o corpo, não era daquelas que suportava o amor trancado no baú do sotão, precisava de pele, foi quando avistou um cais, era ele, na mesma rua que ela, porém em direção oposta, correu então para chegar antes do encontro, mudou a posição das setas, e contou estórias de coincidências fabricadas em destinos, forjara o próprio amanhã, desperdiçara os segundos que aconteciam agora, encolhera todos os sonhos até caberem todos dentro da caixinha pequena de planos encomendados para os dias invariavelmente imprevisíveis, tornara-se meta.

noite que virou lenda

sentamos nas janelas do céu, e nos desmembramos em estrelas cadentes a espera de olhos pra congelá-las, falamos das coisas mais importantes da vida, combinamos listras com bolinhas, e quando nos demos conta já era dia, e o mundo real nos fazia convites pra amanhecer no seu compasso, sempre tão destoante do nosso.

muros de invenção

despedira das asas quando percebera seu corpo encaixando no dele, não era um adeus, era uma espécie de transição para um aconchego que equilibrava o seu ar, construira mundos inteiros pra acreditar na história com começo, meio, e sem fim, mas os dias eram estupidamente avessos aos muros de invenção, não respeitavam o tempo da gestação, abortavam os desejos sem raízes que pudessem suportar as vontades, então apesar de toda construção, ela mesma já não acreditava nos passos em vão, e ainda assim continuava a caminhada sem distância percorrida, no mesmo ponto de chegada...

domingo, 2 de outubro de 2011

resposta do tempo

uma hora ou outra desbota a cor da tinta pintando paredes, uma hora ou outra a fruta desmancha seu sabor em função do tempo mais veloz que sua eternidade, uma hora ou outra a tecnologia pára de responder e convence que outra melhor que ela já encontra-se nas prateleiras por detrás das vitrines, uma hora ou outra o corpo diminui o ritmo e a vida lá fora continua a acelerar, o bonito disso, é que uma hora ou outra a pétala se encolhe por reconhecer os limites das estações, o bonito disso, é que o céu responde sempre a altura do movimento das coisas da terra, e difícil é compreender esta resposta, o bonito disso, é que um olhar encontrando outro explica quase todas as coisas, e o excesso de perguntas é o mesmo que não sentir o corpo inteiro pulsando desde que ele apareceu.

70 anos e sonhando...

 sonhos, os seus, não envelhecem. não porque sejam eternos - mas porque são renováveis, e mudam de cor.  sonhando desde sempre, você não foi...