sábado, 12 de setembro de 2015
refugiados de si mesmos
e no final da contas, é uma guerra de ideias. como se as diferenças não fossem coabitáveis no mesmo espaço de tempo e de endereço. dispara-se o tiro contra o outro em sua aparente diversidade, sem se dar conta da mais profunda semelhança. criam-se fronteiras e legitimam-as como se a divisão dos mundos fosse necessária e parte da natureza das coisas. denominam como refugiados aqueles cujos corpos registram a marca da intolerância, as quais uns podem dizem que é contra o outro, mas eu diria que é em essência contra si mesmo. e nesta guerra que se arrasta há anos, é difícil encontrar qualquer fresta de razão em tantos fins justificando os meios.
quarta-feira, 2 de setembro de 2015
escrever é um eco
escrever é capturar o eco. por instantes, fica uma espécie de ruído nos rondando. pra ver se a gente se salva, a gente busca na palavra uma forma de transbordar o copo. acontece, que o líquido escorre, sem levar consigo o ruído. até que os dias passam, surgem outras cenas, a vida segue o seu movimento nada linear, e o ruído permanece. custa pra gente dar conta de colocar numa página aquilo que nos povoa, e quando isso ganha a dimensão das palavras, eu confesso: não há salvação maior.
terça-feira, 14 de abril de 2015
desabafo
não consigo achar normal isso de ter gente por trás das grades. não consigo achar normal a gente precisar das grades. também não consigo achar normal quem defenda que esses meninos não podem viver sem as grades.
domingo, 22 de março de 2015
meu pai
verdade é que nessa vida faz muita diferença ter alguém por nós. basta acontecer a mínima sensação de queda e lá vem ele, feito super herói, e com toda a sua humanidade desata os nós e deixa o mundo bonito outra vez. eu hei de ler sua obra e reproduzi-la letra por letra. mais uma vez obrigada, por entre tantas possibilidades, você ser justamente o meu pai.
quinta-feira, 12 de março de 2015
toda quarta-feira é Natal
por trás das grades a família foi preservada, mas sem cheiro e sem pele. sobrava imaginação, mas faltava a liberdade de outrora. nos dias de visita, ele dizia: "Débora, pra mim toda quarta-feira é Natal". e assim, no fim dos abraços, logo começava a contagem regressiva dos dias-horas que faltavam para o próximo Natal.
quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015
será maldade dos eucaliptos?
não há discussão: são lindas a longas fileiras de eucaliptos estrada afora. organizadas que só elas, tais árvores crescem elegantemente para o alto, numa tentativa de chegar o mais próximo possível do azul-infinito. mas para toda essa beleza há também um porém: de tanto sugarem a água não deixam espaço para outros tons de verde se aproximarem. os eucaliptos vivem em um bando só deles. cada árvore segue de mão dada com a outra, e apesar da visível união, elas são excludentes por natureza. por isso, eu me pergunto: será isso maldade dos eucaliptos?
quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015
cronograma de papel para seres humanos
é verdade que daqui de
cima as coisas ficam pequenas lá embaixo, mas quando ficam miúdas é possível
perceber como uma coisa interage com a outra. ir lá em cima é essencial para
ver as fronteiras, e é na pequenez das coisas que a gente compreende os seus sentidos.
com os pés no chão o zoom aumenta muito, e as coisas se fragmentam, só dá pra
ver um ângulo. trabalhar com adolescentes privados de liberdade tem sido o
maior dos meus desafios. as metas dificultam o acesso ao andar de cima, e por
vezes, a gente fica correndo atrás de si mesmo. os prazos dos relatórios muitas
vezes não coincidem com o tempo das coisas aqui embaixo, e a gente acaba por
cumprir um cronograma de papel para seres humanos. e apesar dos pesares, eu
prometo que ainda vou achar um brecha, uma fresta, uma luz.
terça-feira, 27 de janeiro de 2015
o menino que não sabe falar de amor
há um menino que não sabe olhar nos olhos, e esse mesmo menino muito faz para não abandonar as grades. os doces de cada dia ele guarda pra trocar pela paz, em formato de droga. mas a paz não chega, e ele continua a busca, e atrás das grades. esse menino não sabe falar de amor, essa coisa tão rara. mas ele só não sabe falar, mas sabe sentir. e toda vez que esse menino pensa em amor, logo ele trás um pedacinho do colo de mãe. ele bem sabe o preço de cada coisa nesse mundo, e não teve dúvida ao dizer que a coisa mais cara era a pamonha que a mãe dele fazia. aliás, pra essa pamonha não existem doces suficientes.
quinta-feira, 22 de janeiro de 2015
talvez
talvez eu me despeça, e a simples possibilidade do não faz-me despedir de todas as coisas, todos os dias, talvez ela fosse embora num susto, nos segundos antes da bala alcançar a matéria que já abandonou a alma, talvez esses meninos se despeçam, talvez eles permaneçam no susto, nessa forma nada poética de depositar no tiro a palavra engasgada, talvez a rima os atravesse, e uma letra puxe a outra, até fazer sentido, até encontrar a voz, talvez os remos sejam suficientes, talvez eles consigam nadar até o porto não tão seguro, talvez a respiração aguente, talvez falte isso: respir(ar), até que o ar não nos falte. amém!
Assinar:
Comentários (Atom)
eu até olho, mas não vejo nada
ao olhar pra você, ainda que pondo meus olhos fixos em você, invariavelmente te perco. poderia supor que isso que evapora quando te olho é ...
-
mas pra isso é preciso desejar sincero e profundo, ao ponto da rua ser toda sem saída, sendo o ponto de chegada o mesmo ponto de partida. ca...
-
ao olhar pra você, ainda que pondo meus olhos fixos em você, invariavelmente te perco. poderia supor que isso que evapora quando te olho é ...
-
foi injusto, apesar de bonito, você ter me deixado o seu cheiro embrulhado. quando abri o presente senti o seu perfume em torno da minha mol...