sexta-feira, 27 de junho de 2008

do lado de fora

Quem? Heesung, 24 anos. De Gangneung Ci - Córeia do Sul.

Em 2005 ele estudou química, por um ano. Entrou no exército em 2006. Na Coréia todos os homens são obrigados a ir para o exército, com exceção dos deficientes físicos ou mentais. Durante os dois anos que ficou no quartel ele tirou férias três vezes, de nove dias cada. A estrutura física do exército é muito grande, três mil militares vivem lá. Ele dormia com cerca de 10 pessoas no quarto. Todos os dias acordava às 6h da manhã. Antes do café todos os militares se reuniam para cantar o hino do país, depois falavam em voz alta as normas morais do exército e em seguida corriam cerca de três quilômetros.

Heesung era responsável pela compra da comida para 1.060 militares. Ele saia três vezes por semana e demorava cerca de 40 minutos para chegar até o supermercado. Eram esses os poucos minutos que ele tinha fora do quartel. Aproveitava para comprar bebidas, que eram proibidas, pra ele e para os outros soldados. Ele também organizava a comida nos regrigeradores e coordenava os militares que cozinhavam.

Nos treinamentos ele aprendeu como jogar uma granada, a atirar, etc. Eu perguntei mais detalhes sobre as atividades e ele respondeu: “Eu não quero me lembrar, eu simplesmente esqueço. É assim que eu lido com as coisas.” Ele já escutou histórias de pessoas que tinham se matado, por não suportarem a pressão. Eis o grande poder da mente.

Heesung tinha que obedecer pessoas mais novas que ele, pelo fato de terem mais tempo no exército. Isso era complicado pra ele, porque na sociedade se respeita as pessoas pela idade, e não pela posição. “Era difícil ter que lidar com regras diferentes”, diz. O exército era composto por superiores bons e ruins. Havia aqueles que passavam muitas tarefas e checavam constantemente o que tinha sido feito, tentando achar algum defeito. Ele contou que após a limpeza alguns chefes passavam o dedo sobre a mesa e diziam: “Limpe tudo de novo.” Isso acontecia mesmo quando o trabalho havia sido bem feito. “Eles me mandavam fazer algo e me batiam se eu não fizesse. Isso não era uma democracia.” Mas os postos eram rotativos: quando ele chegava no posto mais alto ele fazia o mesmo com seus subordinados. O homem é um ser realmente contraditório. Não sabe lidar com o poder.

Eu queria saber mais. Queria saber mais sobre coisas que a gente não pode ver. Perguntei se já havia chorado e ele com as mãos afoitas disse: “Eu nunca chorei no exército. Aliás, chorava as vezes. Não me pergunte isso de novo”.

Nenhuma resposta foi completa. Foi necessário sugar algo naquela parte da nossa mente que guardamos as memórias abandonadas. O menino com cara de lua e roupas apertadas agora estava livre e não sabia o que fazer com as portas abertas. Ele veio para a IICD fazer o programa de trabalho voluntário, mas após duas semanas desistiu. É que o mundo é muito infinito... e ele ainda não consegue parar para olhar.

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